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sábado, 20 de janeiro de 2018

Menos Facebook, mais internet...

Começando:
Já há algum tempo, venho me preocupando muito com como eu mesmo (e o mundo, na verdade) ando usando a Internet. A forma como o Facebook me dominou (justo eu, que sempre - ou, pelo menos, desde os 17 anos - fui um usuário polivalente desse mundo virtual) começou, há um tempo já, a me incomodar. Tentei algumas estratégias para reduzir minha frequência de uso do Facebook, mas logo fui percebendo que, sem Facebook, eu não sabia mais como usar a Internet e me percebi, de repente, preso numa microcela no meio do espaço sideral. Ainda me vejo nela. É linda, mas pequena e tem uma janelinha bem emoldurada de onde eu vejo a Terra girar. Ela vai girando, girando, e às vezes eu até acho que estou nela. #sqn

Primeiro corte
Eu tenho 17 anos e consegui comprar/ganhar (meio a meio) meu primeiro computador. Não havia internet banda larga (ou eu desconhecia sua existência) e tinha que esperar, todo dia, dar meia-noite para poder acessar a Internet (quem acessa a Internet hoje em dia?). Aos sábados, a brincadeira podia começar mais cedo, às 14hs se não me engano e eu podia deixá-la conectada até segunda de manhã, se ninguém precisasse usar o telefone. Naquele tempo, telefone e internet disputavam espaço. Eu já tinha entrado no Orkut e, aos poucos, fui entrando no msn, criando esse blog, esse fotolog, descobrindo meus sites favoritos, baixando músicas em programas de compartilhamento, etc. Tudo era muito lento naquele tempo e dava pra eu usar a internet enquanto fazia outras coisas. E era importante pensar no que se ia fazer para não se perder tempo. Não valia à pena visitar (alguém visita alguma coisa hoje?) todas as páginas de todos os conhecidos, todos os sites, todas os álbuns que todos tinham no Orkut. Você escolhia alguns favoritos e sua rede de contatos se limitava a eles. O mundo era menor nesse tempo, mas, por outro lado, a gente conhecia melhor quem/o que queria conhecer... Saudades desse tempo. 

Segundo corte:
Tenho 22 anos e vou passar as férias de julho na Argentina. Faço alguns amigos, desses de viagem, cuja amizade não sobrevive às ferias seguintes. Lá fora ninguém tem Orkut. Todo mundo usa o Feirbuk (ou como dizem por aqui Feicibuk). Entro nele também, adiciono os amigos de lá, acho chato e deixo pra lá, acessando-o esporadicamente para ter notícias dos amigos perdidos pelo mundo. Dois anos depois, de repente, todo mundo daqui começa a me adicionar no Facebook, o Orkut vai sendo deixado de lado e passa a ser alvo de piadas e menosprezo. Quando o Facebook se populariza, passam a dizer que estão Orkutizando o Facebook. Quem me dera! #ripOrkut Ele morre, mas já tinha morrido antes, ao tentar transportar para ele as "inovações" de Zuckerberg. Não tem mais depoimentos, não tem mais limites para fotos e, de repente, a opinião de todo mundo sobre as coisas mais banais começam a aparecer na sua tela do computador e, logo depois, do celular. A todo o tempo. 24 horas por dia. O monstro não para de crescer: vem Instagram, Whatsapp, Snapchat, Twitter. Tudo toma uma proporção gigantesca e, de repente, eu me vejo usando a Internet, sem sequer digitar um site qualquer na barra de endereços. Só links que alguém viu, gostou e compartilhou. Mas quem viu primeiro e por que viu? Saudades daquele outro tempo.

Terceiro corte:
Estou assistindo a entrevista do Nicolelis e da Laís Souza ao programa do Bial e, em algum momento, Pedro Bial pergunta ao neurocientista se a descoberta do algoritmo (esse que faz a Netflix te indicar filmes ou o Facebook apresentar propagandas específicas para você) não seria a verdade absoluta, uma vez que a nossa vida inteira seria ditada por ele. Lindamente, Nicolelis marca um posicionamento forte de que nós não somos máquinas e que, na verdade, querem (quem?) impor ao ser humano um padrão de comportamento que não corresponde à nossa condição humana. Na época, eu estava fechando a minha tese, já atrasado e sem tempo, naquele momento em que você vê seu tema em tudo o que olha, e não consegui deixar de articular a fala dele a um conceito com o qual eu trabalhei na tese: o de políticas cognitivas, da professora Virgínia Kastrup. Essa postagem, inicialmente, seria sobre isso, mas não foi, justamente porque não sou uma máquina e minha mente me levou, na escrita, por caminhos que eu não esperava ir... Saudades de ter tempo. 

Quarto corte:
Sai essa entrevista no El País da cyberantropóloga Amber Case. Logo de cara, ela diz assim: "Quando me levanto pela manhã devo me perguntar se dedico tempo a mim mesma, se posso meditar, desenhar, se escrevo. Mas o fato é que o meu dia a dia está tomado pelas notificações do telefone, do computador. Então, que tempo de reflexão me reservo?" Muitas pessoas compartilharam essa entrevista no Facebook e algumas, inclusive, me marcaram ou me enviaram o link. Eu que já vinha compartilhando minha angústia por estar preso ao Facebook e ao celular, que já tinha excluído alguns aplicativos e retirado as notificações, de repente, encontro palavras que manifestam bem meu incômodo. Mas palavras não salvam ninguém. Não as dos outros. Saudades do tempo das minhas palavras.

Quinto corte:
O Facebook, que já tinha voltado pro meu celular, me indica esse programa especial de fim de ano do GregNews, no qual ele apresenta uma resolução de fim de ano muito semelhante à minha e que nomeia essa postagem: "Menos Facebook, mais Internet". Eita! Seria o algoritmo definindo quem eu sou? Talvez, mas foi o corte decisivo: de repente, minha #mentenãomáquina integrou todos os cortes anteriores e mais um monte de coisa e foi dado o ponto final: em 2018, eu escreveria mais (fora do Facebook!), desenharia mais, leria mais (fora do Facebook!) e usaria mais a internet fora do Facebook. Eu só tinha esquecido (#mentenãomáquina, né?) que eu já havia decidido isso antes e que não adiantou muita coisa, porque não basta eu decidir isso, se todo mundo que usa a Internet ainda acha que o Facebook é a Internet. Saudades dos tempos de Orkut.

Voltando:   
Eu baixei o Moment - um aplicativo que diz quantas horas por dia você passa no celular - e descobri que tenho ficado, em média, de 3h a 5h por dia com ele nas minhas mãos. Isso é a soma de pequenos minutos que poderiam estar sendo usados de outra maneira. Percebo que pra eu poder sair da #minicelafeicebuk, eu preciso voltar a um tempo em que o uso da Internet era mais lento. Eu preciso descentralizar meus usos on-line: preciso voltar ao blog, ao fotolog (exagero talvez?), aos sites que eu visitava antes, preciso voltar a ter uma lista de páginas favoritas, ver vídeos vendo os vídeos, e por aí vai. Está difícil, porque isso envolve sair do celular e sentar na frente do computador. Envolve eu construir um tempo que se perdeu de algum modo na minha vida. Na minha e na de muita gente. Sem querer, enquanto escrevo isso, eu lembro que não só muitos jovens (meus ex-alunos, por exemplo) construíram sua relação com a Internet mediada pelo Facebook, como muitos adultos também. Todos que estão uma geração acima de mim e que hoje vivem no celular só conhecem a Internet do modo como ela existe há uns 10 anos, quando os smartphones se popularizaram. Para mim, isso é assustador e eu que vivi por aqui outros tempos não podia deixar de tentar fazer diferente. Bom... Vamos tentando... 

Fechando:
Eu, hoje, só hoje, 20 dias depois que planejei escrever esse texto, o fiz, mas ele está aqui, quase feito. Outros pequenos passos estão sendo dados: notificações bloqueadas (todas!), menos grupos no whatsapp, e a busca por fazer do Facebook um espaço menor. Pelo menos um deles, porque, paradoxalmente, eu decidi ter dois facebooks: um pequeno, com pouca gente, com menos informações pra me tentar (se possível, cada vez menos...), sem nada (se possível...) de trabalho. Esse vai ficar no celular. E outro, com mais gente, onde não é preciso apagar as pessoas da minha vida (essa postagem ia ser sobre isso, mas, de novo, não foi...), mas também não é preciso saber tudo sobre todas elas o tempo todo. Assim, quem sabe, eu consigo selecionar melhor não o que as pessoas vão saber de mim, mas sim o que eu vou saber delas. Quero voltar ao tempo em que era possível esbarrar com alguém que não via há muito tempo na rua, dar um #oitudobem e ter novidades pra ouvir. Muitas novidades, que possam preencher o espaço de um tempo bom de conversa, sem que um "ah, eu vi no facebook" constrangedor emperre o ritmo da narrativa.  

Por fim:
Esta postagem ia ser sobre muitas coisas que não foi. Na minha cabeça ia ser um texto muito bacana, que também não foi, mas sei também que a escrita tem seu tempo e é preciso dar o seu tempo a ela. Ia revisar, mas achei melhor não, considerando a tentação de querer apagar tudo. Porém, curiosamente, relendo os textos antigos desse blog, antes de fazer esta postagem, achei esse texto que me disse muito do que eu queria dizer agora. Para quem chegou até aqui, fica aí a dica e a prova de que eu posso escrever melhor do que eu fiz agora. Maldito Facebook que destruiu minha capacidade criativa! 😞

2 comentários:

Patricia Botelho disse...

Seus sentimentos traduzem parte dos meus, amigo! Viva seu blog! E, claro, terei que repostar na famigerada rede social... Bjs

Diego disse...

Estamos juntos nessa batalha, Paty! =D